Existimos e não vivemos

Existimos e não vivemos  – Corria o mês de Março de 2011 e eu fazia a minha experiência de cruzeiro, no itinerário Durban/Cidade do Cabo, com uma escala em Port Elizabeth.

Foi depois da escala em Port Elizabeth, com direito a desembarque para algumas compras e visita a alguns pontos turísticos desta cidade do Cabo Oriental, com destaque para o lendário trilho Donkin Heritage Trail, no bairro histórico de Old Hill, que, regressado ao paquete, ocasionalmente travei uma conversa com um dos passageiros que só hoje a dou a devida relevância.

Na companhia do falecido Machado da Graça, tomávamos umas “tequilas” num dos restaurantes do navio, quando se aproximou um velhinho que, com o desenrolar da conversa, fiquei/ficamos a saber que era de nacionalidade australiana.

Papo puxa papo e a dada altura o viúvo aposentado australiano disse que fazia, no mínimo, sozinho, duas viagens de cruzeiro por ano. “Poxa, isso é que é viver!”, exclamei, ante o aceno cúmplice do Machado da Graça (que Deus o tenha!), ao que o velhote retorquiu: “engano vosso. Eu não vivo, apenas existo”.

Espantando, pedi ao idoso australiano para me interpretar a sua tese que, sem rodeios e agitando o copo da sua “tequila” em minha direcção disse:  “posso apostar que entre nós (os três) quem vive és tu. Este (apontando ao Machado da Graça), talvez, também. Agora, eu, apenas existo”.

Continuei sem entender e o velho turista esclareceu: com esta idade não faço mais que desfrutar da minha reforma, com momentos de solidão em terra ou num cruzeiro, sem capacidade para diversão alguma como o fazia antes de atingir os 69 anos de idade. Agora você está aqui no bar, se não está com a tua namorada ou esposa, pode conquistar alguém aqui no cruzeiro e passar bons momentos com ela. Podes fazer isso aqui ou em terra firma. A isso é que se chama viver e não existir.

Com o advento da pandemia da covid-19, não porque de repente todos ultrapassamos os 69 anos de idade referenciados pelo ancião australiano, mas por causa da covid, melhor entendo a diferença entre o viver e o existir. Muitos dos habitantes do Mundo, senão todos, por estes dias apenas existimos e não vivemos.

Existimos e não vivemos porque já não podemos conviver com os nossos.

Existimos e não vivemos porque não podemos abraçar os nossos e até temos que recear nos aproximar até de quem mais amamos.

Existimos e não vivemos porque quando perdemos um ente querido temos que evitar acompanhá-lo à sua última morada.

Existimos e não vivemos porque temos que andar “mascarados” a “toda a hora”.

Existimos e não vivemos porque temos que fazer “ene” testes, até com resultados contraditórios e esquisitos, tomar uma série de doses de uma vacina em menos de um ano que nem sequer evitam a doença de que receamos [muito estranho não é? ].

Existimos e não vivemos porque não podemos estudar, trabalhar, viajar como antes da maldita covid-19.

Existimos e não vivemos porque, porque, porque, uma infinita lista de motivos suscitados pela maldita covid-19. Aliás, mal se pode fazer viagens, quanto mais de cruzeiro, talvez, quem sabe, podia reencontrar o meu “amigo” velhote australiano para lhe dizer que afinal existe uma grande diferença entre viver e existir, conceitos que em 2011 mal percebia.

REFINALDO CHILENGUE

Este artigo intitulado “Existimos e não vivemos” foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Redactor, na sua edição de 07 de Janeiro de 2022, na rubrica de opinião denominado TIKU 15

Caso esteja interessado em passar a receber o PDF do Redactorfavor ligar para 21 305323 ou 21305326 ou 844101414 ou envie e-mail para correiodamanha@tvcabo.co.mz 

Também pode optar por pedir a edição do seu interesse através de uma mensagem via WhatsApp (84 3085360), enviando, primeiro, por mPesa, para esse mesmo número, 50 meticais ou pagando pelo paypal associado ao refinaldo@gmail.com. Gratos pela preferência

Compartilhe o conhecimento
  •  
  •  
  •  
  •  
  •  
  •  
  •  
  •  

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *