O Túmulo Errado (02)

O Túmulo Errado (02) – A dois de Janeiro de 2020, parte da família Zindhede (ver RedactorN 6291), anciãos e funcionários da agência funerária reuniram-se para destruir a campa edificada num túmulo errado.

Antes da actividade, cada um dos envolvidos contou o sofrimento que tivera na noite anterior, das ameaças do fantasma macua que para além de gritar, chutava utensílios domésticos no interior das residências.

Concluindo que construíram a campa marmorizada no túmulo errado, pegaram em picaretas e marretas, e por medo de outras consequências, nenhum dos envolvidos naquele dia estava sob efeito de álcool.

Dirigiram-se ao cemitério e em pouco tempo desfizeram a campa de mármore, mas antes de abandonarem o local, debatiam sobre o destino a dar o entulho. Para onde levar? Começou uma discussão acesa no cemitério de Save, sob olhar impávido dos defuntos. Os da agência funerária diziam que não levavam de volta pedaços de mármore, porque para além de não ter validade, o trabalho deles era apenas de montar campas. Os anciãos justificavam que a idade já não permitia carregar pedras pesadas enquanto a família Zindhede reiterava a insignificância de levar algo de género para casa, que não representasse o clã Simango. Para isso decidiram que deviam espalhar o entulho naquele labirinto que dá acesso a nossa última morada.

Daí não se ouviu mais a voz do fantasma macua, mas a ficava a dívida de se identificar o verdadeiro túmulo do velho Zindhede, que, segundo o filho, era razão da sua falta de sorte na sociedade.

Como nenhum ancião queria voltar a viver o inesquecível momento da noite anterior, foram a um renomado curandeiro, que segundo os hábitos africanos é a ponte entre os vivos e os mortos, para ouvirem sobre a localização da campa e a pretensão do malogrado que nos deixara fisicamente há vinte e dois anos.

O curandeiro, sentado e de pernas abertas, ia exibindo equações e fórmulas da ciência africana para dar solução a preocupação dos aflitos. Num abrir e fechar dos olhos recomendou-os para voltarem ao cemitério, vasculharem a mata na zona da massaleira, prestando atenção no local onde os pés começarem a fazer comichão. Depois de três horas de vasculha em cemitério denso onde afugentaram no seu habitat serpentes e lebres, finalmente os pés começaram em simultâneo a comichar, para uma alegria suada dos envolvidos. “Tamuana Zindhede”, o que quer dizer “Encontramos Zindhede”.

É de facto ciência africana que nos orgulha, mesmo com a ocidentalização que nos cega. Caro leitor, segundo MATARUCA/2020, na África temos nossos anjos e nossos demónios, mas os defuntos africanos são poderosos, perfilam na hierarquia de deuses, ocupam o nosso panteão e nunca devem ser desprezados, independentemente de qualquer nível de literacia que tivermos adquirido por sorte do destino. (O Túmulo Errado (02))

(Fim)

ORTEGA TEIXEIRA                                                                                               

Este artigo foi publicado intitulado “O Túmulo Errado (02)” foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Redactor, na sua edição de 08 de Abril de 2022, na rubrica OPINIÃO.

Caso esteja interessado em passar a receber o PDF do Redactor favor ligar para 21 305323 ou 21305326 ou 844101414 ou envie e-mail para correiodamanha@tvcabo.co.mz 

Também pode optar por pedir a edição do seu interesse através de uma mensagem via WhatsApp (84 3085360), enviando, primeiro, por mPesa, para esse mesmo número, 50 meticais ou pagando pelo paypal associado ao refinaldo@gmail.com.

Gratos pela preferência

Compartilhe o conhecimento
  •  
  •  
  •  
  •  
  •  
  •  
  •  
  •  

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *