Cardiologista alerta

Cardiologista  – O uso de produtos de risco reduzido para o consumo de tabaco é um dos temas mais controversos na actualidade, no debate que se trava entre a indústria de produção, por um lado, e especialistas em saúde pública e activistas anti-tabaco.

Quando a indústria tabaqueira procura fazer uma transição para um mundo sem fumaça, especialistas continuam a recomendar mais cautela no uso dos novos produtos alternativos ao cigarro. O cardiologista moçambicano Reginaldo Banze toma o exemplo do cigarro electrónico para argumentar que há, sem dúvidas, redução dos riscos associados à queima de tabaco, mas adverte que os produtos de risco reduzido não são, ao todo, inofensivos.

Abandonar o cigarro e outros produtos que implicam a queima de tabaco é uma das principais bandeiras do momento da indústria tabaqueira, em todo o mundo. A indústria está numa corrida sem precedentes para a disponibilização de dispositivos de risco reduzido, como alternativa. O seu argumento principal é de que o desejável é, as pessoas que fumam abandonar o hábito por completo e os não fumadores nunca iniciarem o vício. Mas defendem que para os que, por qualquer razão não conseguirem parar de fumar, então, os novos dispositivos constituem uma alternativa menos nociva à saúde.

Mas Banze insiste que do ponto de vista de saúde pública, a melhor solução é mesmo parar de fumar, principalmente para os fumantes que já desenvolveram algum tipo de doença associada ao consumo de tabaco.

De acordo com o médico afecto ao Hospital Central de Maputo (HCM), naquela que é a maior unidade sanitária do país, por exemplo, há cada vez mais fumantes que se apresentam com doenças associadas ao consumo de tabaco. Para essas pessoas, o especialista sempre deixa uma mensagem vigorosa.

“Não há negociação. Têm de abandonar o tabaco. Não há uma alternativa, nem cigarro electrónico, nem nada (…). É abandono total e absoluto de tabaco, porque só um único cigarro já altera o funcionamento normal do organismo”, diz.

Admite, no entanto, que para os que não conseguirem para de fumar, comparativamente ao cigarro convencional, dispositivos como o cigarro electrónico podem ajudar a reduzir o risco de doenças associadas ao consumo do tabaco, ainda que, no seu entendimento, esses dispositivos não sejam assim tão inócuos.

“O que se verifica, em termos de diferença, é que, contrariamente ao tabaco, que tem cerca de sete mil substâncias nocivas, esses cigarros electrónicos também têm essas substâncias, só que não na mesma quantidade, no mesmo poder de destruição tal como é (a queima do) o tabaco”, afirma.

“Não vale a pena pensarmos que os cigarros electrónios são inofensivos. Não, não são inofensivos. Já há relatos de doenças, incluindo cardiovasculares, resultantes do consumo dessas substâncias que se pensa que são substitutos”, refere, defendendo que as pessoas devem estar cientes disso.

“É preciso que as pessoas tenham a consciência de que o cigarro electrónico, sendo um substituto potencial do cigarro convencional, não está isento. A pessoa passa a consumir, mas com a consciência plena de que o risco não é zero. Então, há-de ser a decisão individual do indivíduo”, diz.

O especialista reprova o facto de, segundo afirma, alguns fumantes usarem os novos produtos como via para reduzir o consumo ou mesmo para a cessação de tabaco, o que, assinala, está errado do ponto de vista de saúde, porquanto existem substâncias e medicamentos próprios concebidos para quem quiser deixar o tabaco.

Fumar é extremamente prejudicial

Contrariamente aos produtos de risco reduzido, o consumo de tabaco, através da combustão, é das mais prejudiciais ingestões para o organismo humano. De acordo com Reginaldo Banze, a fumaça é um problema de saúde pública, tendo em conta as suas consequências nefastas. Segundo o médico cardiologista, as consequências vão desde doenças cancerígenas, sendo o mais comum o cancro do pulmão, até doenças cardiovasculares, com destaque para o Acidente Vascular Cerebral (AVC).

“As pessoas que consomem o tabaco têm um risco duas vezes mais (de desenvolver o AVC), quando comparamos com as pessoas que não consomem tabaco. E as pessoas que fumam também têm um risco entre 2 a 4 vezes mais de ter uma doença cardíaca”, exemplifica. Mas as consequências incluem doenças dos vasos, que podem terminar em ruptura e até morte, se não houver assistência médica imediata.

Outras consequências ligadas ao consumo do tabaco passam pela alteração na função respiratória. “Além de cancro e doenças de coração, as pessoas podem ter, por exemplo, doença pulmonar destrutiva crónica que é, também consequência de consumo de tabaco”, acrescenta a fonte, apontando, também, a diminuição da potência sexual para os homens.

Ainda mais quando, para se ter essas consequências, não é preciso ingerir grandes quantidades. “É claro que, à medida que o volume ou quantidade de cigarros vai aumentado, a chance também aumenta, mas um cigarro já é suficiente para criar alterações no organismo de um indivíduo”, alerta.

Banze anota que, contrariamente ao que sucedia há cerca de 20 anos, por exemplo, quando, ao nível do HCM, entrava, em média, um caso de AVC em cada três a quatro semanas, agora são cerca de três a quatro casos que dão entrada por dia, ainda que todos os casos não sejam exclusivamente causados pelo consumo do tabaco.

“Mas é preciso perceber que a associação de diferentes factores de risco, nomeadamente tabaco, tensão alta, colesterol alta, obesidade, concorrem todos para o surgimento dessas doenças e geralmente esses factores andam todos juntos. Os indivíduos que consomem tabaco, por causa das substâncias contidas no tabaco, o seu colesterol começa a subir. A justificação para o consumo do tabaco pode ser, por exemplo, um padrão de vida ligado a alguma sobrecarga e stress, que também contribui muito para as causas cardiovasculares. Então, esses factores todos concorrem para isso e o tabaco também está associado a casos de hipertensão, que vêm subindo cada vez mais”, explica.

Dentre os elementos nocivos do tabaco, aponta o monóxido de carbono, que é um químico que compete com o oxigénio no organismo humano. “O monóxido de carbono interfere com a utilização do oxigénio dentro do organismo, razão pela qual as pessoas desenvolvem as doenças respiratórias porque como o oxigénio não é suficiente, o organismo começa a se readaptar para lidar com uma situação de aparente escassez de oxigénio. Então, o coração tem de trabalhar mais rápido que é para aumentar a oferta de oxigénio. É assim que, logo depois de a pessoa fumar, o coração começa a bater mais rápido, os vasos ficam mais contraídos. Então, esse efeito cumulativo que se estabelece, de forma crónica, é responsável por grandes males, pela alteração na estrutura dos vasos que mais tarde vai criar placas de gordura, que podem causar os infartos no coração e o AVC”, descreve.

Como se não bastasse, os prejuízos não são restritos aos consumidores activos. “Não. Há que ter em conta, também, o tabagismo passivo e hoje em dia pensa-se que até 600 mil mortes, à escala global, podem ser resultantes do tabagismo passivo – pessoas que não fumam de forma activa, mas que são expostas ao tabaco dos que consomem”, avança.

A substância mais activa que os fumadores procuram no cigarro é a nicotina, que é mais responsável pela criação do vício e da dependência. Acredita-se, por isso, que os dispositivos alternativos podem oferecer este produto sem, no entanto, causar os menos danos à saúde que resultam do consumo do cigarro.

PMI

https://bit.ly/3oc1lWc

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