Dinheiro torrado

Num país cuja pobreza é a canção de todos os dias, o dinheiro vira um xudô para todos. A vida incerta e a sobrevivência tornam-se a tónica de todos. Num país onde todos são condenados à estagnação, um prato de comida é preferência e preferencial, principalmente para as crianças. 

Num país de guerra. Num país que o desemprego acentua-se a cada dia. Que a qualquerização da juventude é a palavra de honra. Num país onde a transparência não se verifica e o sistema eleitoral é o proponente das fraudes eleitorais, falar-se de eleições vira piada. Ora vejamos:

Este ano (2024) teremos eleições e anuncia-se que será encaixado um valor de 6.500 milhões de meticais. É isso mesmo! Muito dinheiro num jogo cujo vencedor já existe, os que irão ganhar medalhas já são conhecidos.  A equipa do VAR já é conhecida e sempre está lá a favorecer o vencedor imbatível. Absurdo! Isso desonra qualquer sonhador.

Como será possível avançar-se para eleições com os mesmos jogadores, árbitros, quartos árbitros, apanha-bolas, no mesmo estádio de sempre? Os resultados nunca foram diferentes. Como será possível confiar num jogo cujo presidente da federação, todos os árbitros e inclusive o VAR são adeptos da equipa vencedora? O que se espera de um juiz que julga o seu próprio caso? Um professor que corrige o seu próprio teste? De um pastor que celebra o seu próprio matrimónio? Um mecânico que repara o seu próprio carro? 

Entende-se por eleições quando o povo vota e não lhe é imposto um governante. Ao contrário disso, chama-se ditadura e todas as ditaduras terminam numa desgraça. Quem se acha sábio usando a força perde credibilidade e acusa-se em consciência. 

Se as eleições avançam com o modelo das autárquicas, são chamados à razão os partidos opositores que não concorram. Literalmente não concorram! Primeiro, é uma humilhação o que eles passam. Segundo, não faz sentido ir a uma eleição que tem vencedor. Sei também que eles irão concorrer justamente pelo dinheiro que o Estado dá. 

Aquele dinheiro faz diferença nos seus bolsos e uns agora concorrerão para ocuparem o lugar do segundo mais votado para mastigar os milhões e as mordomias.

Se os partidos concorrerem, teremos concluído que não têm ideologia e não sabem o que defendem. Deixar o vencedor correr sozinho não é só uma punição, como também grande humilhação. Perderá credibilidade e confiança dos países amigos. Reduzirá os apoios e será obrigado a usar a democracia para fazer parte dos países amigos democráticos.

Deixar o vencedor correr sozinho não é fraqueza dos partidos opostos. Isso mostra inteligência e maturidade e não só, mostra também estratégia de novos caminhos para a liberdade. O povo saberá o que fazer e isso imprimirá uma força raivosa naqueles que queriam votar e não o podem fazer devido à ausência do seu candidato. Esta é uma estratégia única e moderna. 

O dinheiro que se anuncia para essas eleições dava para apetrechar com carteiras as escolas onde a partir deste ano os alunos pagarão uma taxa por elas. E podem ter certeza que as taxas de carteira serão pagas, mas nas escolas não terão carteiras.

Dinheiro esse que dava para alimentar os nossos deslocados de guerra. Pagavamos os madjermanes, os profissionais da saúde que estão aí se lamentando, os professores que não vêem as suas horas extras e que esse perigo será reflectido nas salas de aula na sabotagem. Pagavamos os 100% do décimo terceiro salário que tem sido uma utopia e que será extinto nos próximos anos. Se o vencedor absoluto voltar ao poder, não haverá mais o décimo terceiro salário. Podem anotar isso!

Como ter um governo humano? Como saber separar o importante do urgente? Como imprimir reflexões sábias aos partidos da oposição? Não seria este o momento de deixar o vencedor com os 250 deputados? Com as províncias todas? Com o país todo? Mesmo nas autarquias ganhas pela oposição, seria bom devolvê-las ao vencedor absoluto antes das eleições gerais. 

Como confiar num processo que está viciado e infestado antes de acontecer? Que o sistema judicial joga a favor do vendedor absoluto? Seria este momento crucial para amadurecer a ideia de voto electrónico ou deixamos assim que o papel engorda as bolsas das mulheres nas filas do dia da eleição na corrida para encher a urna? Ou estamos satisfeitos quando a bala come no dia das eleições?

Seria este modelo novo das eleições? O uso da força, aliás, urinar gás lacrimogéneo contra a população, será isso aceite num país democrático como o nosso? Não é um modelo dispersatório para que o vencedor absoluto faça das suas? Eleições ou desgraça popular? Eleições ou máfias partidárias? Eleições ou um grupo de criminosos organizados? Eleições ou sabotagem ao estado? Eleições ou legitimação da ditadura? 

Estas eleições, em vez de nos ajudarem a eleger governantes humanos, nos trarão desgraças, lamentos e, sobretudo, desespero. Muitos sentirão na pele e serão carne para canhão. 

JÚNIOR RAFAEL OPUHA KHONLEKELA

Este artigo foi publicado intitulado “Solidariedade social” foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Redactor, na sua edição de 23 de Janeiro de 2024, na rubrica OPINIÃO.

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