As encomendas políticas

Este é o país em que vivemos. Que temos e que nos ofereceram. Ninguém escolhe nascer num país ou numa família. Não se escolhe nascer negro ou branco, alto ou baixinho, gordo ou magro, pobre ou rico, estudado ou analfabeto. Mulher ou homem. Religioso ou incrédulo. 

O lugar de nascimento ou as condições de vida coincidem com a vontade de Deus. Também não se escolhe os tipos de governantes a ter, embora haja eleições e eleitores. Digo não se escolhe tocando pelo seu carácter e compromisso social. 

Neste país tudo se paga pelo favor. Em qualquer lugar que se for tem de se deixar algum valor como garantia de algo. As vagas são vendidas, tratar algum documento tem de pagar gorjeta, ou seja, tudo tem preço e os cidadãos não têm mais valor. Até dar à luz paga-se e, caso não, deixa-se morrer a mãe e o bebé pela sua rebeldia ou ousadia de não pagar a enfermeira. Morreu porque não pagou os mil meticais. 

Agora em tempo de candidaturas para os deputados da Assembleia da República, vemos encomendas nas províncias. Um repolho que vive em Maputo vai concorrer em Nampula como se Nampula não tivesse ninguém com capacidade para representar o seu povo. Afinal o que diz a lei?

Já disse em edições passadas que neste país os dirigentes são os mais violadores das leis. Eles incentivam a não se respeitar a lei. Se a lei funcionasse, esses repolhos que emigram para outras províncias com alegada representação popular deviam ser banidos. São essas incongruências que o Conselho Constitucional devia resolver. Aliás, uma dessas incongruências. 

Ora vejamos: um repolho nascido em Tete, viveu boa parte da sua vida em Maputo, casou-se lá, tem família e emprego lá, fala nyungue e changana, nunca chegou em Nampula, da noite para o dia é deputado daquele círculo eleitoral. O que isso significa?

Que projecto de país nós defendemos? Que sonhos temos para com este país? Outros repolhos estão espalhados para outras províncias em nome da gratificação, pois eles comentam horrores nos programas televisivos e são agraciados com cargos políticos. Ou seja, a mensagem é clara, basta nao ter carácter, será deputado. Será que a bajulação hoje é passaporte para vencer na vida?

Onde se deixa o escrúpulo? O pudor político? Até para concorrer a formador provincial para o STAE exigem pagamento de quotas, por que se aumenta a precariedade do Estado? Para o assunto do STAE, voltaremos a abordar e se possível com nomes nas próximas folhas. Agora a indignação é com os repolhos humanos espalhados pelas províncias a candidatos da Assembleia da República. 

Esses repolhos não irão com a missão de se tornarem deputados, outros são olheiros e talvez sejam enviados para apontarem as pessoas que pensam diferente e, por conseguinte, os esquadrões autuarem.

Eles não são deputados. Nós como moçambicanos recusamo-nos a aceitar políticos por encomenda. São eles que estragam o desenvolvimento do país comentando coisas que respondem aos seus estômagos. Queremos homens e mulheres com punho de cidadão e que sonham um dia ter um Moçambique mais equilibrado e desenvolvido. 

Se não há pão para maluco, não pode haver repolho humano e encomendas políticos nas províncias. Isso cansa as pessoas e ofende os militantes dessas províncias que estão lá há anos vendo as suas solas de sapatos tortas nas várias marchas de campanhas eleitorais. Esses militantes são descartados como comida do dia anterior? 

Já que foi descartado, você merece um lugar melhor, onde será respeitado e ouvido. Os outros já se encontram em outros lugares.

E você, vai fazer o quê?

JÚNIOR RAFAEL OPUHA KHONLEKELA

Este artigo foi publicado em primeira mão na edição em PDF do jornal Redactor do dia 14 de Junho de 2024.

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