BM/Nyusi/EUA/FMI
A substituição do Governador do banco central ocorre a menos de duas semanas da deslocação oficial do presidente Filipe Nyusi aos EUA, que integrará Rogério
Zandamela, durante a qual está previso encontro com a Managing Director do FMI,
Christine Lagarde.
Nyusi apresenta-se assim com uma “cara nova”, e, mais importante,
com alguém que conhece os corredores do FMI como poucos – um “trunfo” para aquele
que é o principal objectivo de curto prazo das autoridades moçambicanas – a retoma da
ajuda do FMI, que teria um efeito de “cascata” da parte de outras IFD (Banco Mundial)
e parceiros internacionais (EUA, Canadá, União Europeia). A reforçar a confiança de
meios próximos da Frelimo está também o facto de Lagarde se encontrar num momento
particularmente exigente da sua carreira, ao ser constituída arguida pela Justiça
francesa devido ao seu papel como ministra das Finanças no caso Bernard Tapie
(pagamento pelo Estado de EUR 400 milhões). Um desafio chave para o novo
governador será a auditoria forense internacional à dívida pública – que o FMI exige,
mas que o governo prefere ver como um processo conduzido pela Procuradoria Geral da
República, recorrendo, quando e se necessário, a entidades internacionais.
Também os trabalhos da comissão parlamentar de inquérito são considerados prioritários. Em entrevista ao semanário Savana, 02.Set, o representante do FMI em Moçambique, Alex
Segura, fez questão de insistir na questão da auditoria: “o governo está a avaliar como
peritos internacionais poderiam apoiar as investigações da Procuradoria-Geral da
República.
Concordamos com esta abordagem. Mas a função dos peritos internacionais
deve ser definida de forma muito clara. Na nossa visão, os peritos devem produzir um
relatório independente de auditoria forense em linha com os padrões internacionais de
auditoria. Ele deve ocorrer em paralelo e como complemento ao trabalho da
Procuradoria. Essa é uma diferenciação crucial”. A “visita” de Nyusi e Zandamela a
Washington será “retribuída” pelo FMI logo a 22.Set, com uma decisiva missão de uma
semana a Maputo, também ela com uma “cara nova”, mas do lado do FMI – Ari Aisen,
novo representante residente.
A probabilidade de Moçambique entrar em “default” após a reestruturação da sua dívida externa é considerada elevada face à situação de sobre-endividamento do país. Outra previsível dificuldade para o novo governador será o fazer a “ponte” entre o BdM e o governo, em questões de reforço de transparência na gestão e supervisão das contas públicas, que o FMI tem também apontado como importantes para normalizar as relações. Após a anterior missão técnica do FMI a Maputo, foram revistas em baixa as projecções para o PIB – 4,5%, face a 6,6% em 2015) – e outros indicadores, além de deixados alertas para os riscos resultantes da situação fiscal, da subida da inflação e da depreciação do metical. O desempenho do país ao abrigo programa financeiro negociado com o governo em Nov.2015 (Stand-by Credit Facility 2015-2017) foi considerado “decepcionante”. Zandamela estará já a preparar um plano de acção, a apresentar à direção do BdM, cuja aprovação poderá significar a libertação da tranche do SCF suspensa pelo FMI. Apontando a sua longa experiência no Fundo, observadores do setor financeiro moçambicano esperam uma postura maisliberal e pró-mercado do que a dos seus antecessores, nomeadamente na cotação do metical – o que pode novamente ser uma fonte de tensões com um governo preocupado com o efeito social de, nomeadamente, novas subidas das taxas de juro. Na tomada de posse, Zandamela apontou a recuperação da credibilidade do
país enquanto grande desafio – “esforço gigante” – para o seu mandato. Informações
fidedignas indicam que Filipe Nyusi poderá não se ficar pela nomeação
de Zandamela, que acrescenta “know-how” e capacidade de influência e interlocução às
autoridades moçambicanas, e substituir também o ministro da Economia e Finanças,
Adriano Maleiane.
A nível interno, além de externo, o facto de Zandamela não pertencer
a nenhum partido, invulgar entre dirigentes de topo da AP moçambicana, é também um
activo quanto à percepção pública de partidarização do aparelho de Estado e confiança
nas instituições.