No Correio da manhã

No Correio da manhã – Não faço futurologia, mas se não tivesse começado no “Correio da manhã” – hoje Redactor -, duvido que tivesse conhecido a trajectória que fiz no plano profissional.

Num contexto profissional em que os recém-chegados e novatos estão sujeitos a ser encaminhados por outros novatos, ter encontrado uma grande referência do jornalismo moçambicano como o “Senhor Editor Refinaldo”, no Correio da manhã, foi um bafejo de sorte.

Aqui, não se aplica o jargão já batido no futebol de que importa como acaba e não como começa. No meu caso, ter sido “tutorado” pelo “Senhor Editor” marcou intensamente o meu percurso.

A matriz diária do então Correio da manhã foi a ignição para uma cultura de trabalho em ritmo alucinante e a edificação de uma ética profissional de grande exigência.

O facto de Refinaldo Chilengue ter passado pela Agência LUSA – onde hoje me encontro a trabalhar-, imprimiu-lhe a obsessão pelo “facto noticioso” e passou-me a mim e aos outros a quem ajudou a crescer o instinto pelo “valor notícia”.

A formação em História que “o Senhor Editor” ostenta também lhe aprofundou o senso por factos devidamente documentados, para a sustentação das “histórias noticiosas”, um legado do qual também tirei e continuo a tirar imenso proveito.

O período que passei no Correio da manhã (1998-2002) foi de uma intensidade inolvidável e deu-me confiança e paixão para acreditar que podia ter futuro no jornalismo. Não sei se eu padecia de uma euforia ingénua, mas o facto é que ainda cá estou e o saldo – desculpem a imodéstia -, tem sido profícuo e se recuasse, repetia a experiência.

Aprendi outro grande valor: a autonomia em pensar os temas a tratar em cada edição, sem depender dos “assuntos” que caem de cima para baixo numa relação marcadamente hierárquica com o Editor. “O que é que tens hoje?”, era uma pergunta ritualizada que Refinaldo Chilengue te punha, mal te deitasse os olhos na Redacção.

Um crime “lesa-pátria” que ele detesta é um repórter que não ler as notícias do dia de todos os jornais disponíveis. Entende que um jornalista não informado era uma “tábua rasa” sem bússolas e inútil para a Redacção.

Mas o rigor e a seriedade com que o “Senhor Editor” sempre leva o trabalho nunca sacrifica a saúde de um jornalismo com humor.

Ri-me muitas vezes com o léxico engraçado com que apimentava a edição das minhas histórias, ensinando-me que não era preciso ser cinzento para comunicar com transparência.

Para um principiante como era quando me juntei à equipa do “Correio”, também fui um afortunado por lá ter encontrado outros grandes seniores como o Alexandre Chiúre e Filimão Saveca, que igualmente me mostraram o caminho, corrigindo e editando os meus garatujos.

O “Correio” também me proporcionou um reencontro com um colega da 8ª classe, o Francisco Carmona -, mas Ilídio nos tempos de escola-, cujo entusiasmo pelo conhecimento e pelo jornalismo também puxaram imensamente por mim.

No Correio da manhã, morreu o sonho que a minha mãe tinha para mim – ver o filho carpinteiro, como muitos “manhambanes” do seu tempo -, mas nasceu uma paixão incomparável – escrever textos e tentar fazer passar a corrente da escrita.

JOSÉ MACHICANE *

*   é actualmente jornalista ao serviço da Agência LUSA e jurista. Escreveu este artigo por ocasião dos 24 anos do jornal Redactor e 14 da revista Prestígio, assinalados no dia 10 de Fevereiro de 2021

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