Advertência e piscar de olho

Advertência: Moçambique passa por um dos momentos diplomáticos mais delicados da sua história, desta vez por causa da crise entre a Rússia-Ucrânia, com Washington a lançar uma advertência clara a Maputo e Moscovo a “piscar o olho” ao regime de Filipe Jacinto Nyusi. Qualquer gesto em falso pode precipitar a economia moçambicana para uma desestabilização ainda maior.

Thomas-Greenfield, enviada Especial dos Estados Unidos da América às Nações Unidas e Alexander Surikov, embaixador da Federação Russa em Moçambique, são os protagonistas que recentemente remataram a diplomacia de Maputo num pronunciado dilema.

Após um encontro com a cúpula da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), Surikov revelou que tinha proposto que as autoridades moçambicanas pudessem comprar petróleo e cereais russo em rublos e sem recurso a intermediários.

Adicionalmente, o diplomata russo deu a conhecer a disponibilidade de Moscovo para a possibilidade de a Rússia abrir um banco em Moçambique, basicamente focado no apoio ao comércio e investimento bilateral.

Em algum momento o banco VTB da Rússia se movimentou em Maputo, mas a sua presença ficou gravemente chamuscada com a eclosão das “dívidas ocultas” – envolvendo 2.7 mil milhões de dólares norte-americanos – cujo processo deverá conhecer o seu primeiro deslinde em tribunal ainda este ano.

O Governo de Moçambique, que volta e meia é acossado por ameaças de motins por causa da carestia da vida, mostrou-se, aparentemente, receptivo à oferta da Rússia e o ministro dos Recursos Minerais e Energia de Moçambique, Carlos Zacarias, admitiu a possibilidade de comprar petróleo russo em rublos.

“Tenho certeza de que estudaremos e verificaremos a viabilidade dessa oferta da Rússia. Se for viável, com certeza o petróleo russo será adquirido em rublos”, sublinhou o governante.

As “carícias” entre oficiais de Maputo e de Moscovo rapidamente encontraram uma reacção de Washington, por via de uma nota amplamente difundida dentro e fora de Moçambique, com declarações de Thomas-Greenfield, Enviada Especial dos Estados Unidos às Nações Unidas.

Mesmo não referenciando claramente o nome de Moçambique, Thomas-Greenfield frisou que “as nações africanas são livres para comprar grãos da Rússia, mas podem enfrentar consequências se comercializarem commodities sancionadas pelos EUA, como petróleo e cereais russos”.

“Os países podem comprar produtos agrícolas russos, incluindo fertilizantes e trigo”, disse Linda Thomas-Greenfield. Mas ela acrescentou que “se um país decide se envolver com a Rússia, onde há sanções, eles estão quebrando essas sanções. Advertimos os países a não quebrarem essas sanções, porque então … eles têm a chance de ter ações tomadas contra eles”.

Refira-se que Moçambique esteve entre os países que se abstiveram em duas resoluções que foram votadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas, uma condenando a Rússia pela crise humanitária na Ucrânia em consequência da guerra e outra suspendendo Moscovo do Conselho dos Direitos Humanos.

No entender de alguns analistas, Moçambique pode estar a entrar num campo minando diplomaticamente, tendo em conta que a crise mundial suscitada pelo conflito armado entre a Rússia e a Ucrânia eclode justamente quando Maputo começava a se apaziguar com as instituições financeiras e de desenvolvimento ocidentais, como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) depois de anos de candeias às avessas por causa das “dívidas ocultas”.

Por enquanto, estas instituições têm denotado disponibilidade de apoiar e/até colocar em marcha projectos e programas de desenvolvimento sustentável em Moçambique.

O mundo ocidental, com os EUA à testa e a Rússia, estão atentos aos passos que Moçambique dá para entrar no prestigiado clube dos produtores e vendedores de gás no mercado mundial, pelo que a disputa “pela menina dos olhos do Índico” promete, ainda, muitos, interessantes e talvez penosos capítulos.

Moçambique será o primeiro país da África Oriental a exportar GNL a ser produzido numa plataforma flutuante, pertencente a um consórcio liderado pela empresa italiana de energia Eni cuja construção aconteceu num estaleiro sul-coreano, tendo chegado em águas moçambicanas em Janeiro, encontrando-se agora ancorada na Área Quatro da Bacia do Rovuma, a cerca de 40 quilómetros do continente.

Esta é a primeira plataforma de águas profundas do mundo a operar em lâmina d’água de cerca de dois mil metros. O projecto Coral South deverá produzir 3,4 milhões de toneladas de GNL por ano ao longo de sua vida útil estimada de 25 anos.

Está previsto um segundo projecto para a Área Um da Bacia do Rovuma, onde o operador é a empresa francesa TotalEnergies. As plantas de GNL previstas para este projecto, estão em terra, na Península de Afungi do distrito de Palma.

Redactor

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