Crédito para a agricultura – III
Um aspecto que não sugere quaisquer discussões contraditórias: o solo de África é genérica e generosamente muito bem-dotado – eu não quero usar a expressão rico – para evitar polémicas alicerçadas em conjecturas subjectivas, emocionais e, nem sempre, sustentadas com fundamentação científica. Assim, acordemos que o nosso continente tem solos bem, naturalmente, apetrechados para a prática da agricultura. O solo africano é generoso.
Afinal África, situada entre os trópicos de Câncer e o de Capricórnio, é o mais morno, o mais tropicalizado e, consequentemente, bom para a actividade agrícola e outras acções correlacionadas como a produção pecuária, silvícola/florestal. Por força desta sua privilegiada localização geográfica, salvo algumas regiões, a África recebe insolação suficiente. Possui temperatura elevada. Goza, portanto, do chamado clima tropical. O nosso continente é assim um gigantesco incubador de machambas.
Inobstante África possua esta rara vantagem comparativa, não desfruta de vantagem competitiva bastante em muitos aspectos inerentes à sua estrutura económica. O primeiro e o principal “handicap” que impede o nosso continente a sair do último lugar do chamado “ranking” do desenvolvimento é o fraco ou inexistente apetrecho educacional dos seus recursos humanos. Os poucos homens instruídos não são portadores de educação científica, técnica e profissional que os aquilatem a explorar racionalmente o património do seu capital natural, dentro do qual se encontra a terra arável, mas inexplorada.
Alguns dos programas de fomento agrícola são pouco bem-sucedidos em África porque os nossos governos são infelizes no diagnóstico do problema que visam resolver. Priorizamos o recurso ao dinheiro, em forma de crédito ou mesmo donativo. Não exaurimos todas as causas subjectivas e objectivas, que, não raras vezes, nos conduzem ao fracasso dos nossos programas, planos e projectos, potencialmente conducentes ao desenvolvimento das economias africanas também por via da agricultura.
Os nossos governos descuram que maioritariamente as populações dos nossos países africanos vivem no meio rural – mais de 60% – e que 80% destes 60% não sabem ler nem escrever. Os poucos alfabetizados são analfabetos funcionais. Isto é, sabem ler o texto, mas não sabem interpretá-lo, porque não entendem o seu conteúdo. Por outras palavras: os poucos alfabetizados rurais papagueiam os textos sem penetrarem no seu contexto. Com este tipo de camponeses fica muito difícil emancipá-los a patamares mais elevados neste bem-intencionado propósito de transformá-los em “machambeiros empresariais de grande escala”.
Fica uma acção quase insustentável, portanto, fadada ao fracasso, encharcarmos os camponeses de dinheiro sem previamente cuidarmos de os ensinar como deverão, com a maior racionalidade possível, gerir aquele dinheiro para mais dinheiro gerar. Impõe-se a concepção, elaboração e a implementação de programas de educação permanente ao camponês. Este não tem de emigrar para a Universidade de ensinamento de gestão agrária. As instituições do Estado que fazem a formação agrária é que terão de ir ao meio rural. Levar os conhecimentos científicos e técnicos ao camponês. Ensinar o camponês a ser mais eficiente na gestão da terra. Como o camponês deverá aumentar a sua produtividade sem provocar a deterioração do meio ambiente? O camponês deverá aprender a planificar o seu ano agrícola, em função da potencial demanda no mercado pelos seus produtos. Assim, evitar-se-á que o camponês desperdice os seus recursos humanos, de insumos e financeiros produzindo itens sem serventia económica no mercado.
Terminarei esta reflexão batendo, insistentemente, nesta minha tecla de sempre: a África precisa de – também e principalmente – não se esquecer de formar a maioria da sua população que vive no meio rural e tem o direito de, neste seu rincão natal, encontrar a felicidade plena por todos nós almejada.
*Economista
Este artigo foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Redactor, na sua edição de 13 de Outubro de 2023, na rubrica de opinião intitulada N’siripwiti – gato do mato.
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