Economistas interpretam decisão do BdM

Economistas moçambicanos dizem que a decisão do banco central de deixar de comparticipar a factura de importação de combustíveis é sinal de que as suas reservas estão no “limite” e pretende travar o desequilíbrio da balança de pagamentos.

“O país está a usar as reservas para poder conseguir manter aquilo que é a taxa de câmbio e, neste momento, o banco central já não pode fazer isso, nós estamos no limite das nossas reservas”, disse Estrela Charles, economista e pesquisadora do Centro de Integridade Pública (CIP), organização não-governamental (ONG).

Charles assinalou que o volume de reservas que está neste momento na posse do banco central cobre, no máximo, três meses e não pode estar abaixo deste tecto.

“O banco central iniciou o ano de 2022 com reservas internacionais líquidas suficientes para a importação [de bens e serviços] de seis meses”, mas entre finais de 2022 e início de 2023, “acabou ficando” com recursos aptos para suportar até três meses de importações, no máximo, acrescentou.

Estrela Charles assinalou que o regulador financeiro moçambicano entende que há muita divisa em circulação no mercado cambial moçambicano, o suficiente para financiar a importação de combustíveis, sem necessidade de uma comparticipação das autoridades.

Alertou, no entanto, para o risco de os bancos comerciais ficarem sem divisas e pressionarem as taxas de câmbio, caso a decisão não seja acompanhada por “outras medidas auxiliares”.

Por seu turno, o economista Elcídio Bachita defendeu que a decisão do Banco de Moçambique mostra que a entidade quer priorizar o uso dos seus activos no financiamento de outras actividades, deixando o apoio à importação dos combustíveis com o mercado.

“Por um lado, isto tem a ver com o posicionamento do Governo no sentido de deixar o mercado regular aquilo que é o preço dos combustíveis em Moçambique, mas, por outro lado, o Banco de Moçambique não se quer ver numa posição de usar reservas internacionais líquidas para encargos da importação dos combustíveis”, realçou Bachita.

Aquele economista notou que o contínuo recurso ao dinheiro do banco central para a importação de combustíveis representa uma pressão sobre a balança de pagamentos.

“Moçambique gasta anualmente mais de USD 400 milhões com a importação de combustíveis líquidos”, enfatizou.

Egas Daniel, economista e coordenador do programa em Moçambique do International Growth Center (IGC) da London School of Economics, defendeu uma maior coordenação entre o banco central e outros atores envolvidos no processo de importação de combustíveis para evitar disrupções derivadas de uma eventual falta de divisas.

“Eu espero que esta decisão do Banco de Moçambique tenha sido coordenada com as outras entidades do setor de importação de combustíveis, por forma a conter os riscos que pode representar”, enfatizou Daniel.

A comparticipação do regulador na fatura dos combustíveis era crucial, porque funcionava como “avalista ou almofada” para situações de incapacidade do mercado cambial em mobilizar recursos necessários à compra de crude, acrescentou.

“Com a retirada desta mão do Banco de Moçambique, certamente que este risco terá que ser gerido pelos operadores”, o que pode “implicar realmente custos adicionais no processo de importação de combustíveis”, alertou.

Mas, prosseguiu, se a decisão for mais bem articulada com os outros protagonistas do mercado dos combustíveis em Moçambique, pode ajudar o banco central a gerir melhor as suas reservas e a canalizar os seus recursos para outros sectores.

A comparticipação do BM nas facturas de importação de combustíveis do país ao exterior remonta a 2005 e chegou a ser de 100% depois de 2010, porque havia “grandes montantes, que variavam entre a 10 a 20 milhões de dólares norte-americanos numa só fatura”, tornando-as incomportáveis para um banco ou conjunto de bancos suportá-la, explicou Silvina de Abreu, administradora do banco central, durante um encontro com a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) na sexta-feira.

Nos últimos anos, “as facturas são bastante fragmentadas”, às vezes da ordem de “um milhão de dólares norte-americanos ou menos”, o que permite que bancos de menor dimensão possam entrar “neste mercado de financiamento para combustíveis”, acrescentou, ao justificar a decisão.

Todo o combustível líquido que está à venda em Moçambique (gasóleo, gasolina e ‘jet’, para aviões) é importado em cargueiros por via marítima.

Redactor

https://bit.ly/41XbJTI

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