Museu da Escravatura em Moçambique

Investigadores e historiadores moçambicanos defendem a necessidade de instalação de um museu da escravatura em Moçambique, tendo em conta o papel desempenhado por este país no processo da escravidão à escala mundial.

O Museu Internacional da Escravatura inaugurado em 2023 em Port Louis, capital das Maurícias, com forte empenhamento da docente universitária e historiadora moçambicana Benigna Zimba (foto de destaque), é tomado como fonte de inspiração para se avançar nesse sentido.

Benigna Zimba, docente na Universidade Eduardo Mondlane (UEM) é conceptora, co-fundadora do Museu Internacional da Escravatura e presidente do Comité Científico desta instituição erguida nas antigas instalações do Hospital Militar de Port Louis, nas Maurícias.

“Moçambique deve ganhar coragem e se debruçar sem tabus sobre o processo da escravatura. Precisamos de ter uma instituição expressamente concebida para tal. Todos nos perguntam porque é que não temos um museu da escravidão. Muitos nos dão ideias e outros subsídios para implementarmos um museu esclavagista no nosso país”, vincou Benigna Zimba, falado ao jornal Redactor em Port Louis.

Para esta académica, Moçambique dispõe de condições para tal, bastando existir vontade política. “Nós os técnicos podemos implementar o projecto, obviamente com parcerias, nunca sozinhos, a exemplo das Maurícias. A UEM dispõe de um espólio imenso e reconhecido internacionalmente”.

Esta ideia é secundada por Júlio Machele, também docente no Departamento de História da Faculdade de Letras e Ciências Sociais da UEM, actualmente a fazer mestrado na Universidade Estadual de Santa Cruz no Brasil.

Para Machele, Moçambique pode fazer do Museu da Escravatura das Maurícias como fonte de inspiração, tendo em conta a quantidade de escravos que foram levados para diversos pontos do Mundo, a partir da também hoje conhecida por “Pérola do Índica”.

Nos princípios do Sec. XIX (1820/1830) – período de pico do fluxo de escravos para as Maurícias – 26% dos escravos neste país rematado ao largo do Oceano Índico eram oriundos da costa moçambicana, como resultado de todo um processo intenso de escravatura durante o Século XVIII, recorda Zimba.

“Quando os escravos oriundos dos portos de Moçambique eram aqui [Maurícias] desembarcados não eram chamados moçambicanos, mas ‘mozambics’, porque nem todos vinham de Moçambique, mas da costa moçambicana, porque no auge do comércio de escravos a captura dos subjugados ia até aos Congos (actuais Congo/Kinshasa e Congo/Brazzaville)”, acrescentou Zimba, que é igualmente membro da Comissão da Verdade e Justiça das Maurícias.

Dossier das compensações

Esta Comissão foi fez o seu trabalho histórico com sucesso, que tinha a ver com a questão da escravatura na sua generalidade e resolver a questão da compensação.

“As Maurícias é dos poucos países no Mundo onde o assunto da compensação foi resolvido da melhor forma possível, sem alaridos nem sublevações. A França fez o seu papel o que contribuiu bastante para a reconciliação nacional e as partes interessadas ficaram satisfeitas”, frisou Benigna Zimba, declinando entrar em detalhes por se tratar de um assunto interno dos mauricianos.

“Não caberia a mim como estrangeira entrar em detalhes sobre este assunto, mas temos as Maurícias como um excelente exemplo no Mundo, onde o assunto das compensações não resultou em querelas políticas”, vincou a pesquisadora moçambicana.

Uma vez mais, sobre esta matéria Júlio Machele entende que Moçambique precisa de contextualizar e aplicar o exemplo dos mauricianos, admitindo, no entanto, não ter ainda reflectido em profundidade sobre esta problemática.

Todos os anos o 1° de Fevereiro é celebrado como se fosse o Dia da Independência. “As Ilhas Maurícias é dos, senão o único país que mais celebra a abolição da escravatura a nível mundial”, salientou Benigna Zimba.

A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) tem prestado substancial apoio às iniciativas das Maurícias para a preservação da História da escravidão no país e na região e se prepara para inscrever o Museu Internacional da Escravatura de Port Louis, como património da Humanidade.

Benigna Zimba e Júlio Machele interagiram com o Redactor em Port Louis onde estiveram a participar, entre finais de Janeiro e princípio de Fevereiro deste 2025 nas celebrações dos 190 anos da abolição da escravatura nas Maurícias (Redactor N° 6999, págs. 1 e 2).

A escravidão foi praticada por muitos povos, em diferentes regiões, desde as épocas mais antigas. Eram feitos escravos em geral, os prisioneiros de guerra e pessoas com dívidas, mas posteriormente destacou-se a escravidão de negros.

Na Idade Moderna, sobretudo a partir da descoberta da América, houve um florescimento da escravidão, tendo muitos moçambicanos sido levados para esta região. Foi assim que se desenvolveu um cruel e lucrativo comércio de homens, mulheres e crianças entre a África e as Américas.

A escravidão passou a ser justificada por razões morais e religiosas e baseada na crença da suposta superioridade racial e cultural dos europeus. Em algumas regiões do Mundo esta prática prevalece, de forma dissimulada.

REFINALDO CHILENGUE (Texto e fotos)

Este artigo foi publicado em primeira mão na edição em PDF do jornal Redactor do dia 14 de Fevereiro de 2025.

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