O paradoxo da vítima – JÚNIOR RAFAEL OPUHA KHONLEKELA
Quando a Justiça Culpa Quem Chora.
Em Moçambique, há um espelho invertido da lógica: a vítima de sequestro não é resgatada pelo Estado, mas punida por ter sido resgatada.
O Ministério Público propõe o congelamento das contas das vítimas, como se o crime fosse um delito duplo — primeiro, o sequestro; depois, o atrevimento de sobreviver a ele. É como se dissessem: “Você foi espancado? Então deve ter merecido. Pagou resgate? Agora é cúmplice”. O criminoso desaparece na névoa da impunidade, enquanto a vítima é arrastada para o pelourinho da suspeita.
Jesus, em sua sabedoria intemporal, advertiu: “Nada há oculto que não venha a ser revelado”. Eis aí a revelação mais crua — um sistema que, em vez de perseguir ladrões, persegue os bolsos vazios dos que foram roubados. A mensagem é clara: neste reino ao avesso, a dor não comove, mas incrimina. Cada sinal emitido pelas autoridades é um hieróglifo de desamparo. “Quem tem ouvidos, ouça”: o silêncio das vítimas é ensurdecedor. “Quem tem olhos, veja”: a justiça, quando se faz cega, escolhe enxergar apenas os fracos.
Como explicar essa equação perversa? Talvez seja o medo de enfrentar os verdadeiros bandidos, aqueles que agem nas sombras com a arrogância de quem sabe que a lei é uma teia frágil. Então, culpa-se o sobrevivente — porque é mais fácil congelar contas do que corações. Porque é mais cômodo transformar o pranto em prova de culpa do que em motivo de reparação.
Os sinais estão todos aí, escritos em letras garrafais: quando um país trata suas vítimas como réus, ele não está combatendo o crime; está é assinando sua própria sentença. Resta saber quem, de fato, tem olhos para ver.
JÚNIOR RAFAEL OPUHA KHONLEKELA
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