Quem “descobriu” Dominguez
Sobre Dominguez: Chama-se José Andrade Botsele (45 anos), a “bússola da vida” lhe dava todas as indicações para o porto seguro e risonho da vida, mas optou pelo consumo excessivo de álcool e de estupefacientes e hoje é um “farrapo” humano que tem como alternativa de subsistência a busca e reciclagem de resíduos sólidos na cidade de Maputo.
Gaba-se pelo passado e com a mão na testa se recorda de que “não é só o Dominguez” – nome pelo qual é mais conhecido Elias Gaspar Pelembe, o actual capitão da Selecção de futebol de Moçambique (os Mambas), que foi por ele “farejado” para depois saltar para a ribalta desportiva.
Para além de Manuelito II, actual capitão do Maxaquene, Botsele diz não se recordar de outros nomes de desportistas por si pesquisados e atirados para o estrelato, “mas há muitos”, confessa e se desculpa: “os restantes escapam-me da memória por causa disto” (diz, agitando suavemente e depois elevando para os lábios um recipiente de um líquido incolor, presumivelmente de uma bebida alcoólica).
Em homenagem ao seu talento na pesquisa e lançamento de atletas que hoje são “estrelas”, na sua maioria no futebol, José Andrade Botsele é hoje mais conhecido e tratado por “Mr. Zé”.
“Já por várias vezes tentei deixar o vício, procurei ajuda de médicos e amigos mas não deu em nada. Perdi prestígio, amigos, família e todo dinheiro que ganhei quando pesquisava jovens jogadores para os grandes clubes em Moçambique”, desabafou.
Tal como muitos jovens, o Mr. Zé disse que entrou para o mundo das drogas e álcool por “influência dos mais velhos”.
“Comecei por consumir drogas leves mas a pressão nos bastidores do futebol me fez querer mais doses de bebida e estupefacientes, logo fiquei viciado até hoje. A ´colômbia´ (uma conhecida “boca de fumo” em Maputo) virou minha casa”, resmunga, encolhendo os ombros.
O mais agravante é que o consumo excessivo de bebidas alcoólicas e de substâncias entorpecentes terá concorrido para que Mr. Zé contraísse infecções nos pulmões e no fígado, um problema diagnosticado há cinco anos pelos médicos.
Botsele é uma amostra clara de como o consumo excessivo de bebidas alcoólicas e estupefacientes pode transformar, negativamente, a vida de um homem que a princípio tem tudo para ser próspero e feliz.
Estudos científicos mostram que o consumo excessivo de álcool e estupefacientes cria lapsos constantes de memória, alucinações e derrames cerebrais em casos mais graves, sendo os adolescentes e jovens os mais afectados.
Hélder Santos, médico especialista em saúde mental e afecto ao Hospital Provincial de Manica, disse ao Cm que o consumo excessivo de bebidas alcoólicas e drogas está no topo das consultas de saúde mental no país.
Apelando, de seguida, “maior vigilância e medidas mais duras” por parte do Governo e da sociedade civil em geral, com vista a estancar este mal que está cada vez mais a destruir a juventude.
Só no ano passado (2016), dados do Ministério da Saúde (MISAU) revelaram que metade das consultas sobre saúde mental no país foi devido ao consumo de álcool, seguido de cannabis sativa e outros tipos de drogas.
No geral, pelo menos quatro mil pacientes procuraram atendimento por perturbações mentais em 2016, devido a este tipo de vícios.
Pesquisa da OMS
Se, por um lado, não há estatísticas oficiais sobre o índice de consumo de drogas em Moçambique, a Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que a chamada “Pérola do Índico” é a que bebe menos álcool a nível da Comunidade dos Países da Língua Oficial Portuguesa (CPLP).
Segundo a OMS, Moçambique partilha essa posição com a Guiné-Bissau que têm ambos consumos per capita inferiores à média africana (seis litros de álcool por ano), com valores de 2,3 e 4,0 litros de álcool puro por ano, respectivamente.
A percentagem de mortes atribuíveis ao consumo de álcool também é inferior à média do continente nestes dois países (1,3% em Moçambique e 1,8% na Guiné-Bissau), assim como a prevalência de perturbações mentais devido a este vício é igualmente menor neste duo (2,6% em Moçambique e 1,8% na Guiné-Bissau).
No sentido inverso, e de acordo ainda com pesquisas da OMS, os angolanos, cabo-verdianos e são-tomenses são os países lusófonos em África que mais álcool consomem, com níveis acima da média africana.
De referir que enquanto em São Tomé e Príncipe o vinho é o mais apreciado, os angolanos, moçambicanos e cabo-verdianos têm na cerveja a bebida alcoólica mais preferida.
EDSON ARANTE