Trabalho infantil em Nampula
Trabalho infantil – A cidade de Nampula, tal como sucede com a maioria das grandes cidades de Moçambique, virou, nos últimos tempos, epicentro de concentração de crianças de várias idades que praticam o comércio informal para o sustento familiar ou em regime puro ne simples de exploração infantil.
Nos lugares de maior aglomerado populacional, tais como, mercados, entroncamentos de ruas e/ou avenidas é notória a movimentação frenética e massiva daquela camada social/etária.
A título exemplificativo, o Correio da manhã entrevistou, recentemente, algumas andrajosas crianças que diariamente deambulam pelas artérias da chamada “Capital do Norte”.
Em plena “Quinzena Africana da Criança” que terminou domingo passado encontramos uma dessas petizes vender cana-de-açúcar, ao preço de cinco meticais uma parcela de aproximadamente um metro de comprimento.
Chama-se A. Domingos e afirma ter 12 anos de idade e oriunda da Ilha de Moçambique, no litoral da província de Nampula. Hoje reside no bairro de Namutequeliua.
Está há sensivelmente dois anos e meio a praticar aquela actividade, alegadamente a mando da sua irmã mais velha, que é desempregada.
- Domingos diz que saiu da Ilha de Moçambique para a capital provincial com o intuito de prosseguir os seus estudos, mas o precário estado social dos familiares já estabelecidos na cidade de Nampula dissipou os seus planos iniciais e hoje é mais uma vendedeira ambulante, com poucas ou nulas perspectivas para o futuro.
Mesmo com a 6ª classe já concluída, esta órfã de pai que sonhava ser enfermeira hoje por hoje tem que se conformar com as madrugadas quotidianas (sai de casa por volta das cinco da manhã) e retorna ao pôr do sol, por vezes com menos de duzentos meticais.
O fracasso da jornada diária (baixa receita obtida) pode minar a possibilidade da parca e única refeição diária digna desse nome, conforme nos afiançou.
Outro “andarilho” involuntário pelas movimentadas e serpenteantes ruas de Nampula que conversou com a nossa Reportagem é R. Joao, de 14 anos de idade, cujo cordão umbilical caiu em Netia, distrito de Monapo.
- João é um “calejado” em sofrimento. O seu calvário assumiu expressão tinha ele apenas oito anos de idade, quando os seus progenitores não conseguiram sanar as divergências e se separaram.
Foi nessa altura que interrompeu os estudos, quando já frequentava a segunda classe de escolaridade, por incapacidade financeira de sua mãe para sustentar o esforço académico.
Com as receitas que consegue na venda de sacos plásticos no mercado grossista de Waresta, o maior à céu aberto da região Norte de Moçambique, R. Joao garante sustento para si, mãe e seus irmãos mais novos.
- João esboça um contagiante, mas agridoce sorriso, quando revela o rescaldo médio das suas vendas diárias que logra levar para a zona do Areal, Bairro de Murrapaniua 2: 150 meticais.
“Gostaria de continuar a estudar, mas a pobreza afectou-nos de forma severa e em casa sou responsável da minha família (mãe e irmãos mais novos). Se hoje exerço esta actividade é para evitar nomes feios, tais como ´gatuno` e um dia ir parar na cadeia. Estou tranquilo com o trabalho que faço”.
Alguns pais e/ou encarregados de educação entrevistados pela nossa Reportagem foram unânimes em apontar a pobreza como principal motivo para empurrar as crianças sob sua tutela para o trabalho infantil.
João Fernando, de 47 anos de idade, empreendedor no mercado grossista de Waresta, diz não ser fácil sustentar os seus quatro filhos com as receitas da venda de alho e cebola.
Mesmo assim, João Fernando diz que ainda não pensou em obrigar os seus filhos a trocar a escola pelas ruas e/ou mercados de Nampula e apelou a outros pais e encarregados de educação dos menores a fazer um esforço redobrado para evitar engrossar o exército de crianças na rua.
“Eu como pai tenho a responsabilidade de cuidar os meus filhos tanto na miséria bem como na riqueza. Neste caso nunca usei crianças para procurar algo de comer”, referiu a nossa fonte.
Francisco José, 32 anos de idade, é outro adulto que falou para o nosso jornal e defendeu a necessidade do cumprimento da lei que proíbe a exploração infantil no país.
Já as crianças que falaram conosco não desarmam e com uma réstia de esperança ainda lança um apelo “ao Governo para nos ajudar”.
AIMAR MALEMA, nosso correspondente em Nampula