A eficácia e ineficácia

O Governo tornou público, na última semana de Março, um pacote de medidas administrativas de cumprimento obrigatório por todos os moçambicanos para evitar a propagação do covid-19, próprias de um país em estado de emergência que entrou em vigor a 1 deste mês e por 30 dias.

Uma semana volvida, o resultado da avaliação da implementação destas medidas que se me oferece fazer é, em alguns casos, preocupante e noutros, encorajador.

No geral, todos estão cientes em relação à doença e ao perigo que representa na vida das pessoas, mas há os que, mesmo assim, refugiam-se na sobrevivência para não cumprirem com o decreto.

O que pegou facilmente nestas coisas de prevenção de coronavirus é a recomendação de que se deve lavar as mãos com sabão, muitas vezes ao dia, ou desinfectá-las com gel. Baldes com torneiras estão em tudo que é canto. Algumas instituições públicas e privadas têm o gel na entrada e alguém para obrigar aos utentes a desinfectar as mãos. Excelente!

Quanto aos cultos religiosos, as igrejas estão a fazer a sua parte com zelo. As missas deixaram de ser presenciais. A cerimónia de domingo de ramos foi transmitida através de canais de televisão. Os crentes acompanharam tudo a partir de casa, afinal a igreja não é o edifício, mas as pessoas. Foi uma maravilha.

As barracas, os bares, os botequins, as discotecas, os tais locais de diversão, fecharam, incluindo salões de cabeleireiro. Alguns, com resistência e outros, porque têm a consciência de que a sua actividade está no grupo de alto risco de propagação do covid-19. Apesar de existirem alguns prevaricadores, é fácil de controlar a situação.

Onde há problemas sérios é no sector dos transportes públicos e privados e nos táxis em forma de motos e bicicletas, caso específico da Zambézia e um pouco da província de Nampula.

Aqui, as medidas mostram-se ineficazes para resolver os problemas que se levantam. Mesmo com o uso da força, há poucas melhorias. O número dos prevaricadores continua significativo, o que é preocupante.

Os transportadores informais (táxi-motos e bicicletas) falam de sobrevivência que o governo não lhes garante se ficarem em casa. Os formais (cooperativas e empresas municipais de transporte), debruçam-se sobre elevados prejuízos resultantes da circulação dos seus autocarros com menos de metade da sua capacidade para manter uma distância entre os passageiros.

Um autocarro que em condições normais leva 90 passageiros, transporta hoje apenas 30 e os semi-colectivos passam de 15 para 05, o correspondente a um terço da sua capacidade. Os terminais e as paragens voltam a registar grandes aglomerados populacionais, algo não recomendável nestas alturas do campeonato.

A crise de transporte reinstalou-se nas grandes cidades, em particular em Maputo, Matola e distrito de Boane, pior agora que não se pode contar com os “my loves”. A situação já estava bem melhoria depois do investimento que o governo fez nos últimos cinco anos neste sector.

Depois há o problema dos táxis-motos e dos táxis-bicicletas que, diferentemente dos outros transportadores que devem levar menos de metade da sua capacidade, a decisão é que parem de trabalhar dado ao risco de propagação de covid-19 que representa a sua actividade.

Tanto para os transportes públicos e privados, como em relação aos taxistas informais, a minha sugestão é que antes de os chamar de desobedientes ou “foras da lei”, seria bom que o governo estudasse atentamente a situação no sentido de busca de uma possível janela para a solução dos problemas que se levantam.

Por si só as medidas de restrição existentes para prevenir o covid-19 não me parecem eficazes na área dos transportes, pois, no lugar de impedirem certas práticas para proteger aos passageiros, a sua aplicação levanta outros problemas que mantêm e, em alguns casos, agravam o risco de contaminação com o coronavirus.

Ainda há espaço para o governo corrigir ou reforçar as medidas administrativas, adstrito ao decreto presidencial que estabelece o estado de emergência, particularmente nas áreas que se revelam problemáticas, como é a dos transportes.

Pode, por exemplo, reintroduzir o subsídio de combustível só para este sector, a vigorar até que o coronavirus seja controlado no país. Seria uma contrapartida que confortaria aos transportadores que já estão apertados com as contas para manter os seus carros em circulação.

Dado às restrições impostas pelo governo, os autocarros e os semi-colectivos de passageiros são obrigados a transportar menos de metade da sua capacidade. Face a esta situação, não conseguem sequer receitas para abastecerem os seus carros.  

O Estado moçambicano tem experiência quanto ao subsídio de combustível. Num passado recente, e por um longo período, subsidiou o preço para evitar o agravamento das tarifas de transporte, em defesa do cidadão comum pressionado com o elevado custo de vida.

Desta vez, o fardo não seria muito pesado, pois o subsídio seria por pouco tempo e tudo regressaria à normalidade depois da crise provocada pelo coronavirus. E calharia numa boa altura em que o preço de petróleo no mercado mundial baixou aos níveis já mais vistos (30 dólares o barril).

Na região ou no mundo em geral, alguns países em estado de emergência como Moçambique preferem baixar o preço de combustível no lugar de subsidiá-lo. O Malawi, por exemplo, em grande crise económica, acaba de anunciar a redução em 16 por cento.

Em relação aos táxis-motos e aos táxis-bicicletas, assunto localizado e característico da província da Zambézia, o tratamento seria outro. Estes fulanos estão registados ou licenciados pelo município de Quelimane para o exercício da actividade.

No lugar de recolher os seus meios, porque não pensar um pouco mais neles? Porque o município, o governo provincial e a Secretaria de Estado não trabalhem em conjunto numa proposta que permita que os taxistas, que têm sido úteis em alguns momentos políticos, não moram a fome enquanto estiverem em casa?

Como uma forma de manter as pessoas em casa, alguns governos optam por distribuir alimentos porta a porta a famílias de baixa renda.

Em Moçambique, o Instituto Nacional de Acção Social tem um programa denominado “Subsídio de Alimentos”. Não seria para cobrir a todos os moçambicanos, mas com um reforço orçamental, o INAS pode usar esta janela para estender o seu apoio aos moto-taxistas, sem perder o seu foco que é de ajudar aos idosos, mães grávidas e crianças chefes de agregados familiares. É uma hipótese, como podem existir outras.

Parecendo que não, estas almofadas são necessárias para a criação de uma plataforma que garanta que todos os moçambicanos observem à risca as medidas de prevenção do covid-19. Custam dinheiro? Claro que sim, mas vale apena assim para que pelo caminho na luta contra o covid-19 não haja prevaricadores em nome da sobrevivência e todos fiquemos a ganhar.

Alexandre Chiure (alexchiure@gmail.com)

Este artigo foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Correio da manhã, na sua edição de 09 de Abril de 2020, na rubrica OPINIÃO

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