Cultura democrática essencial para o aperfeiçoamento da democracia
Cultura democrática deve ser entendida como um conjunto de crenças, atitudes, normas, percepções e inclinações que alicerçam a participação (Gabriel Almond e Sidney Verba, dois cientistas políticos).
As pessoas devem acreditar que a democracia é feita a partir de casa, na rua, no bairro, na escola, cidade e incutir que quem detém o poder da transformação na sociedade é o próprio cidadão.
Para o efeito, as comunidades devem ser estruturadas e apoiadas para desenvolverem actividades comunitárias colectivas onde se cria o hábito de partilha de opinião, crenças positivas e desenvolvimento de valores que sustentam o modelo democrático de convivência com tolerância e diálogo.
Em resumo, numa sociedade, a cultura democrática deve fazer parte do modus vivendi do cidadão, das comunidades, das instituições e do país.
Na cultura democrática, as comunidades são ensinadas a usar da palavra para emitirem a sua opinião, escolherem e serem escolhidas para representarem e participarem em todos os processos de tomada de decisão baseada em regras e regulamentos aprovados na legislação.
Os países que preparam os cidadãos para uma cultura democrática gozam de uma estabilidade política que contribui para a definição harmonizada das políticas de desenvolvimento.
No nosso caso vertente, Moçambique, engana-se quem pensa que somos democratas por:
─ De cinco em cinco anos irmos às urnas e fazermos de contas que estamos a escolher os nossos governantes e representantes nas assembleias,
─ Assegurarmos que estes pleitos não falhem no ciclo definido,
─ Credenciarmos observadores internacionais que se limitam a acompanhar o processo de votação do ponto de vista de organização, horário de abertura das urnas e de encerramento para, de seguida, fazer uma avaliação do processo,
─ Um eleitor, por iniciativa individual ou a mando de terceiros, tentar introduzir mais que um boletim de voto na urna,
─ Um brigadista, Membro de Mesa de Voto (MMV) por troca de umas centenas de Meticais, receber boletins falsos para introduzir nas urnas,
─ Um presidente da mesa receber instruções da hierarquia para não assinar as actas e editais e acatar a ordem em prejuízo do processo,
─ Um director do Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) de nível local aceitar uns milhares de Meticais para alterar a vontade expressa nas URNAS pelo cidadão,
─ Serem recenseados cidadãos não elegíveis para a eleição num determinado ponto,
─ A Comissão Nacional de Eleições (CNE) tomar conhecimento de ilícitos e ficar indiferente para, de seguida, anunciar resultados errados,
─ O Conselho Constitucional (CC) validar o processo e mandar repetir a eleição em algumas mesas através de um acórdão tornado público para, dias depois, proceder à sua correcção em sessão fechada,
─ Quando os mesmos actores que deram origem à repetição voltarem a estar em frente do processo da repetição da votação.
Portanto, temos estado a participar em processos eleitorais com défice de cultura democrática individual e/ou colectiva.
O barulho pós-eleitoral que caracteriza os nossos pleitos eleitorais em geral resulta da ausência da cultura democrática do cidadão eleitor, dos partidos políticos, das instituições gestoras dos processos e das lideranças ao mais alto nível.
A comunidade internacional está ciente disso, olha para os nossos processos e apenas lamenta, mas nada pode fazer a luz de convenções internacionais.
Como nação, precisamos de aperfeiçoar a nossa visão democrática. Até porque, no extremo, caso seja necessário, podemos parar para reflectir melhor, treinarmos as populações para melhor entenderem o essencial do jogo democrático, recriar os órgãos de administração eleitoral e retornarmos mais fortalecidos.
Os erros de procedimento são tantos agora e de difícil correcção. Precisamos de coragem para corrigir algo no nosso modelo eleitoral, tipo:
despartidarizar a CNE, STAE e CC.
Vamos encontrar um modelo de selecção e recrutamento de cidadãos para integrarem e dirigirem estes órgãos.
A partidarização acarreta custos elevados ao país e cria comodismo nas pessoas.
Nunca é tarde, tudo treina-se!
Este artigo foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Redactor, na sua edição de 12 de Dezembro de 2023, na rubrica de opinião denominada Nunca é tarde, tudo se treina!
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