Danos do tabaco

Danos do tabaco – A situação das populações mais vulneráveis aos riscos associados à fumaça foi um dos temas da 5ª Cimeira Científica sobre Redução de Danos de Tabaco nos dias 21 e 22 de Setembro último.

O evento decorreu de forma híbrida (presencial e virtual), a partir da Grécia, e especialistas de várias partes do mundo, incluindo África, defenderam a necessidade de se dar maior atenção aos grupos mais vulneráveis, que estão entre os mais expostos aos danos causados pelo consumo do tabaco.

Organizada pela Associação Internacional de Controlo do Tabagismo e Redução de Danos, a Cimeira deste ano decorreu sob o lema “Novos Produtos, Pesquisa e Política”.

Um dos painéis abordou a temática ligada às disparidades que se verificam em vários países, sublinhando-se a importância de encontrar respostas adequadas face às necessidades dos grupos de maior risco.

Intervindo a partir de Nova Iorque, Helen Redmond fez uma abordagem sobre a oposição que existe no seu país contra os novos produtos de redução de danos associados ao consumo de tabaco.

Segundo Helen Redmond, trata-se de uma oposição que surge de todos os quadrantes, incluindo de organizações ligadas à saúde pública, que defendem que as pessoas parem completamente de usar a nicotina.

O uso dos chamados Produtos de Tabaco de Risco Modificado (MRTP) é uma das principais bandeiras da indústria tabaqueira, que defende que os mesmos contribuem de forma significativa para a mitigação de danos em fumadores que não conseguem parar de fumar.

Redmond disse que organizações poderosas e com dinheiro têm estado envolvidas em vigorosas campanhas visando impedir que estes produtos sejam livremente comercializados nos Estados Unidos.

Essas organizações, acrescentou, conseguiram nos últimos anos instalar pânico sobre os novos produtos de risco reduzido, desencorajando as pessoas de abandonar o vício do cigarro.

Redmond acusou a Agência de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA) de um jogo duplo, afirmando que ao mesmo tempo que autoriza o uso destes produtos, junta-se também a organizações que se opõem a esses produtos.

Por isso, afirma, “as pessoas dizem que alguma coisa está errada com a FDA, e infelizmente há muitas pessoas nos Estados Unidos que ainda acreditam que os produtos de risco reduzido não são seguros, pelo que é preferível continuar a fumar”.

Acrescentou que um outro problema é que a classe política nos Estados Unidos não se importa se a população vulnerável morre de doenças relacionadas com o consumo do tabaco.

“É terrível, mas essa é a realidade, porque se houvesse preocupação, podiam fazer alguma coisa”, observou, destacando que os EUA têm o histórico de não se preocuparem com doenças que afectam pessoas vulneráveis, dando como exemplos a atitude das autoridades americanas em relação ao HIV/SIDA e, mais recentemente, à pandemia da Covid-19.

A questão, avançou, é o que fazer e como lidar com esta realidade. Olhando para frente, Helen Redmond disse haver vários exemplos, não só nos EUA, mas também em várias partes do mundo, onde milhares de pessoas recorreram aos produtos de risco modificado, abandonando o cigarro.

Para essa luta, defendeu a necessidade de um activismo mais vibrante. Entende que não haverá mudanças sobre as pessoas sem o seu envolvimento. Por isso, insistiu, é preciso as pessoas se organizarem para lutarem pelo seu direito em prol de produtos seguros, da mesma forma que é necessário pressionar a FDA a fazer boas coisas. Enfatizou a urgência de pressionar os vários poderes de modo adoptarem políticas de apoio aos grupos mais vulneráveis, tirando as pessoas do vício do consumo do cigarro.

A comunicação social, defendeu, deve veicular histórias de pessoas que conseguiram fazer a transição, mostrando como as suas vidas mudaram.

Disparidades sócio-económicas

Do Reino Unido, Peter Harper, oncologista de profissão, apresentou dados que mostram como milhares de pessoas usam tabaco naquele país, mas também à escala global.

Contudo, disse, a prevalência da fumaça mostra disparidades em vários países. Mas são disparidades não só entre países, como também dentro de países, de modo que os níveis de fumaça são altos em certas regiões e em certos segmentos da sociedade.

Harper apontou as disparidades sócio-económicas como uma das variáveis que explicam a prevalência do consumo do cigarro no Reino Unido. Também apontou diferenças na base da educação, indicando, por exemplo, que as pessoas menos escolarizadas têm 29% de probabilidade de serem fumadores, contra 7% de pessoas com formação mais alta.

Na variável emprego, as pessoas no activo têm 12% de probabilidade de fumar, contra 29% de desempregados. É por isso que as soluções para a redução dos danos do tabaco incluem uma aposta na educação e no aumento do emprego, considera Harper.

Acrescentou que é preciso garantir melhores recursos e abordagens para reduzir o consumo do tabaco nos grupos onde se situam as mais altas taxas de consumo, que é geralmente entre os homens.

Castillo Rafael, das Filipinas, mostrou as disparidades a partir do exemplo de um jovem do seu país, com baixos rendimentos, que gasta, por dia, cerca de 8% a 10% dos seus parcos recursos para comprar cigarros.

Rafael reforçou a noção de maior prevalência no consumo de tabaco entre pessoas pobres e com baixo nível de ensino, acrescentando que países com um baixo nível de desenvolvimento sócio-económico também apresentam níveis mais altos de consumo, devido a dificuldades para adquirir os dispositivos de risco reduzido.

Rafael demonstrou que no caso das Filipinas, os dados indicam que 7 em cada 10 fumadores poderiam parar de fumar porque acreditam que é mau para a sua própria saúde, mas que apenas 4% conseguiram abandonar completamente o vício nos últimos 12 meses. “Então, há grande disparidade”, disse, defendendo a necessidade de identificar grupos de maior risco e procurar implementar programas para a sua redução.

Um dos pontos mais controversos na luta pela disponibilização de produtos de risco reduzido tem a ver com os encargos fiscais que os países impõem na importação dos novos dispositivos.

Para Castillo Rafael, uma legislação que alivie a carga fiscal poderia ajudar na redução do consumo do cigarro. Mostrou que nas Filipinas gasta-se mais dinheiro para tratar doenças causadas pelo fumo do cigarro do que se colecta na tributação desses produtos alternativos.

Além de os ganhos com a tributação não compensarem os gastos com a saúde pública para lidar com os danos do tabaco, há que ter em conta vidas que se perdem, recomendou.

Adquirem cigarros ilícitos e baratos

Solomon Rataemane é um psiquiatra da África do Sul. Segundo o especialista, a situação do seu país é similar a vários países da África Austral.

Para demonstrar as disparidades, com foco nos grupos vulneráveis, tomou o exemplo do período pandémico quando, por causa da Covid-19, o Governo da África do Sul, tal como vários outros governos, proibiu o consumo de tabaco e álcool em espaços públicos.

Rataemane diz que um estudo sobre a matéria, realizado no ano passado, mostrou que embora esse banimento tenha trazido alguns benefícios, expôs, ao mesmo tempo, a população a cigarros ilícitos, oriundos de países vizinhos.

“Esse negócio cresceu”, afirmou, acrescentando que na África do Sul, as camadas mais pobres e as pessoas desempregadas adquirem cigarros ilícitos e baratos.

Como se não bastasse, diferentemente do primeiro mundo, a África do Sul, além das condições infra-estruturais, tem falta de psiquiatras habilitados para guiar os pacientes, daí a necessidade de estabelecimento de clínicas no sector público, que sejam acessíveis aos mais vulneráveis.

Sublinhou que o ideal é que as pessoas parassem de fumar, mas que isso muitas vezes não é possível. Mostrou que na África do Sul, por exemplo, 65.7% dos actuais fumadores tinham prometido deixar de fumar, mas que apenas 40.5% fizeram tentativas parar atingir esse objectivo nos últimos 12 meses.

Na África do Sul, a prevalência mais alta está entre os homens (41,7%) contra 17% para mulheres.

PMI

https://bit.ly/3oc1lWc

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