Especialistas dizem que urge colmatar percepções erradas
Especialistas e outros intervenientes na luta contra o tabagismo estiveram reunidos no dia 16 de Novembro em Londres, para discutir formas de reduzir doenças e mortes relacionadas ao consumo de tabaco e explorar estratégias mais eficazes para o reforço da saúde pública.
Dentre os vários temas, foi destacada a necessidade de analisar e colmatar a desconexão entre as evidências científicas e a percepção de risco dos cigarros electrónicos.
Discorrendo precisamente sobre o tema “percepções de risco de cigarros electrónicos”, Sarah Jackson, investigadora principal em Ciências Comportamentais e Saúde, no Colégio Universitário de Londres, deixou claro que os cigarros electrónicos são menos prejudiciais e mais eficazes do que os cigarros convencionais, que se baseiam na queima e produção do fumo do tabaco.
Todos os esforços dos movimentos de luta contra o tabagismo assentam sobre o princípio de que a melhor opção é nunca experimentar o consumo de tabaco. Aos que já são fumadores, o conselho é pararem de fumar. Contudo, para os que não conseguem, recomendam-se alternativas menos prejudiciais à saúde.
Os cigarros electrónicos, consideram os especialistas, constituem parte dos produtos alternativos que podem minimizar o risco de doenças associadas ao consumo de tabaco, para além de estarem livros da nicotina, substância bastante aditiva.
“Os cigarros electrónicos são eficazes para ajudar as pessoas a pararem de fumar”, disse Jackson, acrescentando que “análises independentes e abrangentes baseadas na ciência concluem, consistentemente, que eles são substancialmente menos prejudiciais que o tabaco”. Examinando evidências científicas em torno assunto, Jackson destacou vários estudos que comprovam a eficiência dos cigarros electrónicos.
Dentre as referidas análises citou um relatório do Departamento de Saúde Pública da Inglaterra, que há oito anos concluiu que embora o uso de cigarros electrónicos não seja necessariamente 100% seguro, estes produtos não contêm a maior parte das substâncias químicas que causam doenças relacionadas ao tabagismo, estimando-se que sejam provavelmente cerca de 95% menos prejudiciais do que o tabagismo.
No contexto da luta contra o tabagismo, existe uma forte linha de pensamento que defende a ideia de que o uso do cigarro electrónico é tão prejudicial, senão mesmo mais prejudicial que o cigarro convencional. Jackson disse que com o tempo, tais percepções estão a piorar do que melhorar.
Mas para contrariar esta narrativa, Jackson citou um outro relatório produzido em 2016 pelo Colégio Real de Médicos, entidade responsável pelo controlo dos padrões profissionais de saúde na Inglaterra, o qual concluiu que os riscos associados ao uso do cigarro electrónico não excedem os 5% dos danos causados pelo tabagismo.
Acrescentou que mais evidências de riscos relativamente mais baixos no uso de cigarros electrónicos em comparação com o tabagismo foram também fornecidas em 2018 através do relatório das Academias de Ciências, Engenharia e Medicina dos Estados Unidos.
Quando as percepções são contra as evidências
Jackson disse estar espantada com a quantidade de pessoas que ainda não perceberam qual é a contribuição dos cigarros electrónicos em levar as pessoas a deixarem de fumar.
“Surpreendentemente, um grande número de pessoas não tem consciência disto e pensa que os cigarros electrónicos são tão iguais ou mais prejudiciais que o cigarro de queima”, observou, referindo-se também a uma série de pesquisas realizadas nos últimos anos para aferir as percepções de jovens e adultos sobre os danos associados ao uso de cigarros electrónicos, os quais relatam que apenas um terço dos inquiridos é que consideram que os cigarros electrónicos são menos prejudiciais do que o consumo do tabaco de queima.
Isso só confirma, diz Jackson, que à medida que aumenta a oferta dos cigarros electrónicos, deteriora-se na mesma proporção a percepção sobre eles, o que dá a entender que o aumento de cigarros electrónicos não resulta de evidências que provam que eles são menos prejudiciais, mas, isso sim, pelo facto de serem vistos como atractivos.
Jackson apresentou vários exemplos de notícias para sustentar que as evidências, geralmente, não são reflectidas na cobertura dos media sobre cigarros electrónicos. As notícias nos media, assinalou, dizem, esmagadoramente, que usar cigarros electrónicos não é seguro e é prejudicial à saúde, o que de certa forma influencia os fumadores a pensarem que estes produtos cientificamente provados como sendo de risco reduzido, sejam tão ou mais prejudiciais.
Por conta disso, alertou, os fumadores poderão estar menos inclinados a mudar para os cigarros electrónicos, continuando, assim, a recorrer à fumaça, que é mais prejudicial à saúde pública e responsável pela morte de milhares de pessoas todos os anos.
Na sua alocução, a especialista enfatizou mesmo que esta desconexão entre a evidência científica e a percepção tem potencial para ter um impacto profundamente negativo na saúde pública.
Por isso, Sarah Jackson apreciou o novo documento de comando sobre o tabagismo e cigarros electrónicos, na Inglaterra, que inclui o compromisso de aumentar o investimento em campanhas nacionais nos meios de comunicação social, oferecendo um potencial mecanismo para corrigir percepções erradas sobre a vaporização.
“Agora, qualquer mensagem sobre cigarros electrónicos exigirá uma reflexão cuidadosa, pois terá um impacto significativo, e evidências sugerem que recorrer a especialistas para desmascarar mitos comuns sobre o uso de cigarros electrónicos pode ser particularmente eficaz”, sublinhou.
Proibições levam a efeitos contrários
Uma das questões inerentes à problemática do cigarro electrónico é o uso de produtos aromatizados. A restrição à venda de cigarros electrónicos aromatizados, seus efeitos políticos e alternativas, foi o tópico abordado pela professora Abigail Friedman, do Departamento de Política de Saúde e Gestão – da Escola de Saúde Pública da Universidade de Yale, nos Estados Unidos.
Friedman afirmou que, a partir de 1 de Janeiro deste ano, que pouco mais de um quarto da população dos Estados Unidos vive numa jurisdição que restringe a venda de dispositivos electrónicos aromatizados o que significa que nessas condições aumenta o volume de venda de cigarros, e, por conseguinte, mais danos à saúde.
Isto porque alguns fumadores, num esforço de abandonar o vício, recorrem a dispositivos aromatizados por acreditarem que tal permite-lhe gradualmente atingir o seu objectivo. As restrições na venda destes produtos têm o efeito de os desencorajar, levando-os a persistir no consumo de cigarros.
Friedman sustentou os seus argumentos com base, em parte, num estudo de análise sobre políticas estaduais de restrição destes aromatizantes, que concluiu que a redução no volume das vendas de dispositivos aromatizados per capita aumentou o volume de vendas de cigarros.
Sobre a regulamentação, Abigail Friedman frisou que o objectivo não deve ser apenas tentar fazer com que as pessoas não utilizem produtos de tabaco e nicotina, mas sim também incentivar os consumidores a optarem por produtos de menor risco, o que precisa de ser uma prioridade.