Relaxe e goze!

Há os costumes. Muita gente sente-se desconfortável se der um passo fora deles. Até há pouco tempo, no Brasil havia uma delegacia de polícia especializada chamada delegacia de costumes. A margem de manobra era menor, e o delegado, necessariamente homem, era o vigilante moral mais activo.

Mesmo nos dias de hoje, as sentenças pomposas dos juízes, ou, tristemente, de juízas pudorento(a)s costumam apelar aos bons costumes. Como o mundo é vário, e os costumes são muitos, eu nunca entendi como se sabe exactamente quais seriam os bons e quais seriam os maus.

Se forem procurados fundamentos ideológicos, ou filosóficos, não se acharão consensos universais, ou mesmo nacionais; aliás, nem pessoais. Então, quem pode mais impõe os costumes que lhe são convenientes aos outros, seja o presidente, seja o pastor, seja a mãe, o marido, ou o patrão.

Dizendo de outro modo: como não há uma razão teórica sustentável para defender o que seriam os bons costumes, a questão é mesmo resolvida nos limites da razão prática. Fica estabelecido que os bons costumes são os meus, e os maus são os dos outros. E estamos combinados.

Estaria tudo bem não fosse o facto de que ninguém combina coisa nenhuma, e pouca gente percebe que os costumes podem ser mera armadilha de dominação. As pessoas cumprem-nos sem pedir conta das suas origens, ou do seu significado, ou, mesmo, da sua utilidade.

Se indagadas a respeito, poderão dar a resposta mais alienada possível: “Ora, porque sim”. Pouca gente suspeita de quem ditou o “porque sim”, muito menos do conteúdo do “porque sim”. Vou propor um assunto controvertido e pleno de “porque sim”: sexo, ou os costumes sexuais.

Creio que todos estamos de acordo sobre não haver coisa mais pensada, falada e buscada do que sexo. Não há quem não goste, ou não queira sexo. É espantoso como o mundo se move em torno de sexo. Bem, parece, então, legítimo dizer que além de pensar, falar e buscar, a humanidade gosta e gostaria de praticar muito sexo. Muito mais do que se pratica.

Isto entendido, pareceria que tudo estaria resolvido, mas há um outro lado: não há nada mais cercado, censurado, vigiado do que sexo. Nem mesmo após os avanços libertários dos anos 1960 a questão foi resolvida; se algun(ma)s pouco(a)s tomaram mais liberdade, muito(a)s outro(a)s se fecharam em uma onda conservadora. Essa onda está por aí.

Para pensar, é interessante saber que o cerco ao sexo é uma tradição semita (leia-se o monoteísmo judaico-cristão-mulçumano). Ou seja, é um costume, só um costume. Suecos e holandeses não são assim, têm outras práticas, os indígenas [brasileiros] não dão importância ao assunto, os romanos e os gregos tinham outro comportamento.

Cada um(a), nos limites do consentimento, que use a cama tanto, como e para o que bem entender, cada um(a) que se resolva, gozando ou reprimindo os seus desejos, mas que saiba que mais ou menos liberdade nos afectos é apenas mais ou menos submissão a costumes de uma tradição que, pensando, pensando, não tem muito sentido.

Matutando com referências da moral ainda predominante, confessemos: nós pecamos, pois, sexo por prazer é pecado. Bem, pecado é uma concepção de ordem religiosa, assim, embora as consciências estejam colonizadas por religião, ou talvez por isso mesmo, pecado não é o “conceito” adequado para considerar as expressões da sexualidade humana.

Sugiro pensar sociologicamente o conflito: nós mudamos, ou, pelo menos, as tantas pessoas que quiseram e puderam mudar, mudaram e não são levadas a delegacias de costume por causa da mudança. Já, ao curtir nosso corpo, buscando nele e no relacionamento com outros corpos os prazeres que possamos ter, o fazemos livres de amarras morais.

Estamos, em práticas pessoais e em expressões públicas de liberdade sexual, reformando progressivamente os costumes, produzindo transformações civilizatórias que valorizam decisões pessoais. Se alguém for contra, peça-lhe um argumento, um só argumento, mas que seja racional. Ou sugira-lhe: namore, relaxe e goze; vai lhe fazer bem.

LÉO ROSA DE ANDRADE*

* Doutor em Direito pela UFSC (psicanalista e jornalista)

Este artigo foi intitulado foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Redactor, na sua edição de 30 de Agosto de 2023, na rubrica de opinião denominado OPINIÃO.

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