O cadáver das flores azuis

E havia um homem morto que andava. Um cadáver que já tinha ido a muitos funerais. Era impressionante o número de rosas mortas que carregava, lindas e brilhantes, mas mortas, todas elas sem a raiz. Os bouquets só tinham rosas mortas e eram rosas azuis.

As costas vergavam por conta da pesada realidade. Eram impressionantes as paixões eternas pouco duradoiras que conhecera, apesar da tenra idade. Era impressionante o tamanho dos sonhos que teimava em seguir, com a perna partida e o orgulho ferido. Coxeava, indo adiante, mesmo com tanta dor e pregos na planta do pé, era um cadáver com a auto-estima que dali a poucos dias iria a funeral novamente.

Mas, naquele dia ia mais uma vez a enterrar a dignidade, e colocar-se de joelhos por reflexo, proferir palavras vãs que tinham muito significado, os seus discursos e manifestos tocavam na alma, mas não interessava, não era o suficiente. O que seria o suficiente? Ninguém dava ouvidos à verdade.

O que era a verdade se ninguém lhe dava ouvidos? Só lhe restava um pouco de dignidade que dali a pouco também seria enterrada. Já não havia fé. A fé há muito que tinha sido enterrada.

E seguia adiante meio esqueléctico, olhava para o tudo e cada vez menos se encontrava na ordem do cosmos, tão confuso.

Gritava! Mas há muito que a língua lhe tinha sido amputada, não havia garganta suficiente para tanto vigor, ninguém tinha tempo para interpretar os tremores doloridos daquele cadáver, ninguém o enxergava, quando muitos desviam-se do seu caminho para não se deixar contaminar, era só mais um desgraçado, malcheiroso, mais um, não fazia diferença, era só dor que ele sentia, mais uma, não fazia diferença, era só tristeza que ele sentia, mais uma, não fazia diferença…  Por mais verdades que contasse ninguém regava as suas flores azuis e aqueles que por algum tempo tinham ido lavar a sua campa e entoar canções também começavam a perder a fé no cadáver das flores azuis…

STÉLVIO Mhttps://redactormz.com/este-so-dorme/ARTINS

Este artigo foi publicado intitulado “Solidariedade social” foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Redactor, na sua edição de 24 de Novembro de 2023, na rubrica OPINIÃO.

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