Perseguição a jornalistas

Perseguição a jornalistas – Exercer o jornalismo de verdade, em Cabo Delgado, é muito perigoso. O risco de ser preso e acusado de revelar segredo de Estado é permanente. Para se safar, tem que escrever o que as autoridades desejam ver difundido ou opta por ficar mudo. A verdade, para a polícia e autoridades judiciais, é escrever aquilo que eles acham que seja certo porque o resto é um atentado ao Estado, é considerado incitamento à violência e apoio ao Al-Shabab. A verdade, em Cabo Delgado, está nos comunicados da polícia e no silêncio da procuradoria. A verdade não existe nos factos. Se um jornalista fizer cobertura a movimentos das populações em fuga, é conotado como do inimigo.

O laptop ou tablet, para a polícia e procuradoria, são instrumentos perigosos porque neles se armazenam informações capazes de desacreditar o seu “árduo” trabalho e conferir credibilidade ao Al-Shabab, por isso, em comunhão, declaram guerra a jornalistas. Levar laptop a tiracolo ou tablet nas mãos é como ter uma granada com a espoleta desapertada que pode explodir. Mesmo tendo, apenas, uma lapiseira e um caderno para apontamentos, pode ser interpelado, detido e apresentado ao juiz de instrução para a sua prisão ter um cunho de lei. Se for surpreendido com gravador, então, a situação fica cada vez mais complicada. Aí ninguém tem dúvidas de estar perante um facilitador do inimigo. Até as autoridades exigem uma carta de autorização da chefia para trabalhar como se não tivesse carta não fosse jornalista. Vamos a tempo de sermos chamados, sempre que lá nos deslocarmos, a uma reciclagem ministrada pela polícia e procuradoria de como se deve recolher, processar e publicar uma notícia.

Em Janeiro deste ano, estivemos em Cabo Delgado, durante quase 15 dias, para procurarmos entender melhor o fenómeno de Al-Shabab. O ambiente era todo de medo. Sempre que alguém batesse a porta do nosso quarto, as acelerações dos batimentos do coração triplicavam por pensarmos que havia chegado a nossa vez de passarmos para o quartel-prisão de Mueda, onde são torturados e encarcerados os capturados de Al-Shabab e outros com eles relacionados. Não sabíamos se havia de passar o dia todo e quando anoitecia, tínhamos dúvidas se estaríamos livres até ao primeiro cantar do galo. Cabo Delgado é outro “style”.

Pesando bem as nossas palavras, podemos afirmar que a censura do regime colonial era um pouco mais tolerante do que a polícia e a procuradoria de Moçambique fazem. Não se sabe onde a polícia e a procuradoria de Cabo Delgado aprenderam o fascismo. A situação e sufocante.

A 19 de Dezembro de 2018, quatro jornalistas foram detidos, em Cabo Delgado mesmo com a carta das autoridades para fazerem o seu trabalho. Estiveram cinco dias nas celas. A cinco de Janeiro do corrente ano, o jornalista da Rádio de Nacedje de Macomia, Amad Abobacar foi, ilegalmente, preso por militares e a procuradoria legalizou a sua prisão, depois de passar alguns dias pelo quartel-prisão de Mueda, na companhia do finado sul-africano Andrew Hannekon, que morreu em circunstâncias estranhas, no hospital provincial de Pemba, a 23 de Janeiro. Agora, o colega de Abobacar, o jornalista Germano Adriano está a contas com a procuradoria que se esquiva dizendo não se tratar de perseguição.

Agora que o Al-Shabab começou a atacar caravanas das multinacionais, talvez a estratégia do Governo venha a mudar e leve o assunto com maior seriedade e perceba, para sempre, que o seu inimigo não são jornalistas.

EDHON HOUUNNOU

Este artigo foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Correio da manhã, na sua edição de 28 de Fevereiro de 2019, na rubrica semanal denominada MIRADOURO

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