Por que sofremos e nos obrigam a ficarmos calados no nosso país?

Chamo-me Rita. Tenho 60 anos de idade. Desde a tenra idade, sobrevivo da agricultura. Nasci e cresci neste ciclo, à semelhança dos meus pais, avós e bisavós. Comigo não foi diferente. Gerei filhos e agora tenho netos que também passaram por lá, na minha antiga machamba de 15 hectares que herdei dos meus progenitores.

Não queria comentar, mas vou fazê-lo. Há algum tempo, tenho vivido, mas sem paz, não há alegria em mim, porque me sinto injustiçada.

Quando completei 15 anos de idade recebi dos meus pais um espaço para fazer as minhas plantações com uma dimensão considerável. Já não me lembro muito bem agora, mas nos tempos plantava, colhia e vendia. Com o dinheiro ganho dava para comprar rebuçados, roupa, sapatos e até mechas para trançar aos finais do ano.

Mas, como dizia antes, ando indignada com as diferenças havidas entre a lei e a prática. Há sensivelmente cinco anos, fui injustiçada, quando da noite para o dia tiraram de mim um espaço de 10 hectares para atribuí-lo a um chinês com planos de investir na pecuária. Não percebi muito bem a explicação, mas as entidades locais não se maçaram em discutir comigo se podiam ou não fazê-lo, simplesmente fui vítima de usurpação de terra. Há anos que tento resolver este caso, mas sem sucesso. Estou desesperada, e com medo, sem saber se ainda serei injustiçada ou não, e caso seja para onde irei apelar pelos meus direitos.

Certa vez, quando buscava por explicações sobre a injustiça de que fui vítima, só me lembro de ter visto a Polícia no meu quintal. Ameaçaram-me para não denunciar este caso à media.”

Esta é mais uma história que como jornalistas temos colhido no nosso dia-a-dia de trabalho, de justiças e injustiças.

Até hoje não compreendo porquê, mas, na minha terra, até parece que o estrangeiro é quem tem mais direitos que os próprios nativos. Alguns dirigentes preferem até passar por cima da lei, em troca de alguns trocados. É o que nos remete a história da dona Rita, semelhante à de várias mulheres e homens injustiçados em vários sectores deste país.

Mesmo injustiçados, não podem fazer simplesmente nada. As histórias terminam em murmúrios ou algo a mais, mas que não traz soluções práticas.

Na minha terra, os estrangeiros podem vir explorar, fazer e desfazer. Ninguém lhes pára, as entidades competentes simplesmente fazem ouvidos de mercador e fingem cegueira.

A nós, nativos injustiças, obrigam a ficar calados.

Na verdade, se calamos não é porque nos agrada, mas sim porque muitas vezes tememos, tememos pelas nossas vidas. Ensinaram-nos ao longo do tempo que se alguém falasse e o fizesse demais pagaria com a própria vida. Foi assim com Carlos Cardoso, entre outros que já não estão entre nós.

NOÉMIA MENDES

Este artigo foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Redactor, na sua edição de 28 de Setembro de 2023, na rubrica de opinião intitulada Geração 2000

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