Vai-se o homem, mas fica a obra

Ouvia-se em meio a lágrimas que caíam aos torrões por baixo de um céu completamente cinzento “Baila Maria”, à entrada do edifício do Conselho Municipal de Maputo.

Naquele local estavam as que indubitavelmente podem ser consideradas as melhores vozes do país. Cada um daqueles Xiricos rendia uma homenagem ao mestre. Era uma ode ao grande.

Chico António, de nome Francisco António ou simplesmente tio Chico, como era carinhosamente tratado, deveria ter pouco mais de um metro e sessenta centímetros e já andava um pouco curvado, quando o conheci. Sempre de chapéu para não deixar escapar nem o estilo e nem as ideias.

O seu percurso era gigantesco. Reparei nisso quando vi as lágrimas na baía de Maputo, que já não sabia qual seria a sua função dado que não seria nunca mais “uma vista digna de um artista”. Inevitavelmente, pensei naquele corredor no 12. ° andar onde morava: “A tristeza que aquilo deve estar”. Foi-se a música, foram-se as cores.

E as brisas do jardim da liberdade para quê voltarão para lá? Já não haverá música para se misturar.

Duro também deve ser para o vizinho que aproveitava tantos shows privados e grátis. Certamente gabava-se dizendo “eu sou o vizinho do sô Chico António”. Qualquer que fosse a dúvida era esclarecida assim que se chegava ao andar: a música do Beethoven da flauta, do Mozart do trompete e do Bach da guitarra com a voz daquele Pavarotti falavam por si.

O facto é que todos concordam: Chico ainda tinha muito para dar. Muito cedo foi-se, entre aventuras doces e amargas e fará muita falta, haverá muita saudade, muita mesmo.

Chico, que ainda muito cedo saiu de Magude para Maputo deixando para trás uma família que nunca mais reencontraria e que também não tinha muita clareza do seu ano de nascimento, como me tinha dito o Pierre Dufloo: “o Chico disse que nasceu em 1958, mas isso implicaria que ele teria chegado a Maputo com quatro anos e isso seria impossível … e ele foi matriculado no colégio aos 9 anos e escolheu treze de Maio como o seu dia de aniversário e é dia da virgem. Pergunto-me porque será que ele escolheu aquela data?”, falava o Pierre naquele português afrancesado enquanto eu fingia que o escutava, alheio na minha descrença de que de facto estava naquele dia a dar um “adeus a Chico António”.

As manifestações um pouco por toda a parte, ao redor do mundo e em Moçambique tanto no digital como no real, deixam claro o legado de Chico. A sua obra vive, como disse um dia Ausgustin Louis Cauchy, repetida mais tarde pelo arquitecto brasileiro Oscar Niemeyer:Vai-se o homem, mas a sua obra permanece”. Chico permanecerá para sempre nos nossos corações e ouvidos. Onde quer que esteja agora de certeza que estará com um copo de whisky sentado ao lado de Manu Dibango, que tanto admirava, Oliver Mtukundzi, Miriam Makeba, Paul McCartney, Michael Jackson, a discutirem o progresso da música e a orquestrarem novas aventuras pós-reencarnação.

Adeus, tio Chico, até sempre!

STÉLVIO MARTINS

Este artigo foi publicado intitulado “Solidariedade social” foi publicado em primeira-mão na versão PDF do jornal Redactor, na sua edição de 19 de Janeiro de 2024, na rubrica OPINIÃO.

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